Um guia colaborativo para melhores conversas
Ferramentas e atitudes que nos ajudam a ter conversas mais profundas e relevantes
Gosto de escrever porque penso devagar. Gosto de dissecar ideias, perceber de onde vêm e como são construÃdas. Escrever dá-me tempo para viajar por diferentes caminhos até chegar a um sÃtio que faz sentido.
É mais difÃcil fazer isto numa conversa. Quando começo a fazer brainstorming em voz alta, sinto que estou a ligar o complicómetro e quando exploro diferentes perspetivas parece que não tenho uma opinião. Por vezes, é-me difÃcil destilar tudo o que me passa pela cabeça numa conversa coerente — espero que não se note; admiro muito as pessoas que conseguem ter um discurso profundo e bem fundamentado.
No outro dia, assisti a algo que me fascinou. Estava num mosteiro budista, e durante a tarde houve uma conversa com um dos monges. Alguém fez uma pergunta e o monge fez algo que não estou habituada a ver — parou para pensar antes de falar.
Este gesto disse-me duas coisas: ele ponderou a resposta e, mesmo antes da pausa, estava atento a ouvir a pergunta. Quando falou, deu um conselho muito prático e, em seguida, fez um zoom out, refletindo sobre a natureza e os valores humanos. Lembrou-nos que todos tentamos evitar o sofrimento e que podemos liderar com essa sabedoria e a compaixão que a acompanha. E em vez de um conselho para uma pessoa, as suas palavras tornaram-se numa orientação universal.
Pode haver alturas em que temos de falar sobre o tempo, mas quando vamos mais fundo, quando exploramos as grandes e pequenas questões da vida com outras pessoas, a conversa pode tornar-se uma caça ao tesouro.
Ultimamente, tenho-me envolvido intencionalmente nesta exploração. Este ano fui a Death Cafes, onde falámos sobre a morte e o luto. Falei com estranhos. Fiquei duas vezes num mosteiro budista e conversei com monges e pessoas da sangha. Disse sim ao convite de uma amiga para participar num Curso Alpha, uma atividade de fé cristã aberta a todos, crentes e não crentes, onde falámos sobre algumas das grandes questões da vida. E perdi a noção do tempo durante muitas conversas com amigos.
Por isso, perguntei-me: quais são as condições ou atitudes que permitem melhores conversas? Como tenho a sorte de ter, perto de mim, pessoas bonitas com quem gosto de conversar, também lhes perguntei (obrigada, amigos!).
A capacidade de ouvir, pensar e dar respostas relevantes pode não ser natural, mas acredito — espero — que possa ser praticada. Por isso, aqui ficam algumas ideias para incentivar melhores conversas, em que nos podemos concentrar para termos mais memórias partilhadas de conexão com os outros.
Tempo
Óbvio, mas difÃcil de conseguir: tirar tempo para falar com alguém, sem sermos pressionados pelo que temos de fazer a seguir. Será que agora é uma boa altura para falarmos?
Estar presente
O nosso corpo está lá, mas onde está a nossa cabeça? Somos capazes de estar presentes, sem distrações, sem olhar para o telemóvel e sem nos preocuparmos com a nossa lista de coisas para fazer? Conseguimos fazer com que a outra pessoa sinta que é a pessoa mais importante do mundo para nós, naquele momento?
Escutar
É preciso saber ouvir para ter uma boa conversa, mas o que é que isso significa? Por um lado, prestar atenção de forma a podermos resumir o que a pessoa disse, fazer uma pergunta de seguimento, ou continuar a conversa e acrescentar algo ao que foi dito. Não basta ficar em silêncio enquanto estamos mentalmente ocupados com o que queremos dizer a seguir.
Outra coisa é não ter medo do silêncio. Se deixarmos passar as pausas sem as tentarmos preencher, damos tempo para que um pensamento se complete, para que seja dito algo que não é tão imediato. Por vezes, o silêncio dá-nos a coragem de dizer o que realmente importa.
O equilÃbrio também é importante. Será que todos têm a oportunidade de participar na conversa? Numa conversa a dois, temos ambos o mesmo tempo para falar e ouvir (em média, na relação, mesmo que haja ocasiões em que um precise de mais tempo de antena)?
Fazer perguntas melhores
Um bom ponto de partida é fazer perguntas abertas e ser especÃfico.
Quem, o quê, quando, onde, como e porquê são boas formas de explorar a experiência humana, mas podemos ir mais fundo: como te sentes agora em relação a isso, o que aprendeste, o que te inspirou, o que esperas/temes que aconteça. Susan Cain dá uma excelente dica: em vez fazer perguntas sobre os factos da vida (onde vives?), pergunta como a pessoa se sente em relação a ela (qual é a melhor parte do sÃtio onde vives?).
E, na altura certa, podemos fazer uma pergunta como se atirássemos uma pedra a um lago e apreciássemos as ondas que faz. Podemos ir macro ou meta:
Qual foi uma coisa que aprendeste nos últimos 5 anos?
O que é que gostarias de fazer mais?
O que é que gostarias que a tua criança nunca tivesse de enfrentar?
Conta-me como foi a última vez que te riste até chorar.
Uma mente generosa
A casa de uma pessoa generosa tem paredes elásticas e uma mente generosa sabe que existem opiniões diferentes — está aberta e disposta a mudar, se necessário. Uma mente generosa tem a capacidade de navegar todo o espetro de um tema, apreciando as diferentes perspetivas.
Avançar com curiosidade em vez de julgamento é essencial para melhores conversas. Mesmo quando não conhecemos o tema, ou achamos que não nos interessa, se fizermos perguntas (conta-me mais!) podemos descobrir algo que podemos apreciar, como a paixão de alguém por um assunto especÃfico ou a coragem de o explorar. Mesmo que alguém tenha uma visão do mundo diferente da nossa, podemos ter curiosidade em saber como essa visão surge e como é viver a vida a partir dessa perspetiva.
As pessoas tornam-se menos defensivas quando sentem que as suas opiniões são respeitadas. Mesmo quando não concordamos com uma ideia, podemos perguntar: se tivéssemos os mesmos genes, fisiologia, educação e formação, terÃamos o mesmo ponto de vista?
Substância
Com quem é que gostas de falar? Essas pessoas são curiosas, pensam sobre a vida, entusiasmam-se com o debate de ideias? Trazem contributos ricos e perspetivas únicas para a conversa?
Quanto mais interessante for a nossa vida, os nossos mundos interior e exterior, mais trazemos para a mesa.
Mindset
Temos melhores conversas se tivermos a intenção de ter melhores conversas. Uma boa conversa pode ir fundo nas nossas almas se levarmos pás para a festa. O que colocamos numa conversa é o que levamos dela e, se começarmos por definir uma intenção, talvez consigamos levar mais.
Também ajuda se compreendermos qual o tipo de conversa que estamos a ter: o nosso objetivo é conectar, explorar um assunto ou resolver um problema? Yael Schonbrun explica-o muito bem aqui. Quando alguém só quer desabafar, podemos definir como intenção simplesmente estar presente, em vez de tentar resolver a situação.
Vulnerabilidade
Uma conversa pode transformar-nos se conseguirmos largar a armadura e mostrar as partes de nós que costumam ficar escondidas. Será que conseguimos ser vulneráveis? Será que conseguimos ser o espaço seguro onde os outros podem largar as suas armaduras?
Se chegaste até aqui, provavelmente estás à procura de melhores conversas na tua vida. Eu também estou. Gosto muito quando, em vez de sentir que estou a complicar a questão, sinto que me juntei a uma batida para a explorar. A minha mente levanta voo quando alguém me mostra uma perspetiva diferente. E sinto-me muito grata pelos momentos em que a conversa se torna pessoal, quando as palavras espelham os nossos desejos e medos mais profundos e nos lembramos que somos seres humanos complexos e imperfeitos que procuram conexão.
Espero que estas palavras nos ajudem a ter conversas tão imersivas e profundas que nos fazem sentir os fios que nos ligam uns aos outros e a tudo o resto no universo.
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Um enorme obrigada às pessoas lindas que deram o seu tempo e sabedoria para responder à minha sondagem — estou muito grata por vos ter na minha vida.
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O que falta nesta lista? O que está a mais? Deixa um comentário!
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(E talvez possamos levar algumas destas ideias para outros momentos, e para quando não nos apetece falar — não é só com conversa que nos relacionarmos. Estar presente quando cozinhamos juntos, ou damos um passeio, também alimenta as relações.)
Tão bom! E fiquei cheia de vontade de almoçar contigo para... conversar. Beijo