Não é de estranhar que no último ano tenha tido mais conversas sobre a morte que o habitual. Gosto destas incursões profundas na forma como as pessoas vêem o mundo e a morte é um tema excecional para isso, apesar de ser tabu para alguns.
Quando alguém me pergunta se acredito numa vida depois da morte, a minha resposta imediata é não, mas sinto quase sempre que a resposta poderia ser sim, mas.
Acreditar é aceitar que algo é verdade, mesmo quando não temos provas. Uma crença é uma opinião, mesmo que por vezes não o pareça; é uma história que contamos a nós próprios, que construÃmos a partir das provas que recolhemos e das crenças das pessoas em quem confiamos.Â
Milagres e magia
Para compreender o que acontece quando morremos, temos de compreender o que faz de nós seres vivos. O nosso corpo é feito de células; as células têm estruturas feitas de moléculas; as moléculas são feitas de átomos, que por sua vez são feitos de partÃculas atómicas, que são uma ponte entre a massa e a energia.
Os triliões de células que constituem o nosso corpo aprenderam a comunicar entre si, a produzir substâncias e a gerir processos, desde a sua própria replicação até à s linhas de montagem que nos mantêm nutridos, saudáveis e descansados. Arthur C. Clarke, um famoso escritor de ficção cientÃfica e futurista, disse: «Qualquer tecnologia suficientemente avançada é indistinguÃvel da magia» - e não há tecnologia mais impressionante do que o corpo humano.
Uma parte fascinante desta operação acontece quando morremos. Quando o coração pára de bombear e deixamos de respirar, o excesso de dióxido de carbono acidifica o sangue, provocando a rutura das células. As enzimas libertadas, as bactérias e, mais tarde, os insetos vão decompor a matéria orgânica. A vida antiga alimenta a vida nova.Â
Não temos de acreditar que somos todos um: é um facto cientÃfico. Tudo o que existe, desde a água do mar, à s falésias e à s gaivotas, tudo é feito dos mesmos componentes básicos, da mesma energia e espaço vazio. A morte é apenas o primeiro passo no processo de entrega do nosso corpo ao universo.
[Apercebi-me disto quando aprendi sobre o átomo na escola e fiquei hipnotizada. Não conseguia compreender como é que as pessoas sabiam isto e não viviam num estado perpétuo de admiração. Na altura não sabia, mas foi nesse momento que a minha mente decidiu estudar engenharia quÃmica].
Somos mais do que o nosso corpo
Muitas pessoas acreditam que existe uma parte de nós - uma alma, uma consciência - que permanece após a morte. Dependendo da crença, esta alma pode reencarnar noutro corpo ou ir para uma espécie de céu ou inferno - e como vivemos aqui vai afetar a experiência na vida após a morte.
Embora a existência de uma alma não seja geralmente apresentada como um facto, há fenómenos inexplicáveis atribuÃdos a espÃritos que tentam comunicar com os vivos; há registos de pessoas que têm memórias sobre as vidas anteriores; há histórias sobre as imagens que aparecem a quem tem experiências de quase morte.Â
Alguns fenómenos têm explicações razoáveis, como as experiências de quase morte: os nossos cérebros têm as mesmas estruturas e fisiologia e deixam de funcionar de forma semelhante, e as alucinações são um dos sintomas de um cérebro com pouco oxigénio. Os outros fenómenos não são tão fáceis de explicar, mas é possÃvel que o sejam quando compreendermos melhor o funcionamento do cérebro. Mas sabermos melhor, estes fenómenos podem ser pistas para a existência de uma alma e de uma vida depois da morte.Â
A história que conto a mim própria
Vejo a minha consciência como um conjunto de experiências e memórias e a capacidade de as contemplar. Inclui tudo o que experienciei, imaginei e pensei, emoções, ilusões, crenças e intuição. Este conjunto existe num cérebro com determinadas caracterÃsticas, num determinado corpo, e desenvolve-se a partir de uma história de vida especÃfica, de um lugar e de um tempo. É também influenciado pelas pessoas com quem interajo e pela sociedade em que vivo.
Não consigo imaginar a minha consciência a sobreviver à morte do meu corpo, mas consigo vê-la a perdurar nas impressões que deixo nas pessoas que me conhecem e me lêem, e nas mudanças subtis que surgiram como resultado da minha existência. Acredito que, com o último impulso eletroquÃmico do meu cérebro, a consciência desfaz-se, e a única coisa que sobrevive é o seu reflexo no mundo.
Tenho uma forte convicção de que isto acaba aqui. Morremos e tornamo-nos parte do mundo que deixamos para trás, num sentido fÃsico e espiritual. Esta é a história que conto a mim própria, e a realidade tal como a conhecemos é suficientemente mágica para mim. Tornamo-nos parte do todo - e isso é deslumbrante.Â
Talvez esteja errada
A maioria da humanidade acredita em algum tipo de vida após a morte. E se tiverem razão? E se houver uma alma que migra através dos corpos, uma alma que continua a viver depois do corpo morrer?
É possÃvel. Afinal, cada um de nós escolhe aquilo em que acredita. E talvez estes rótulos de certo e errado não sejam importantes, e o que importa é se esta crença muda a forma como vivemos a nossa vida, e se a muda para melhor.
E tu? Em que é que acreditas?