2023: Um novo equilíbrio
Este ano, e mais uma vez, o peso deslocou-se na balança e criou um novo equilíbrio.
Publiquei um texto pela primeira vez a 13 de outubro de 2023, o dia que celebra a linguagem clara e o cancro da mama metastático. Aposto que não são muitas as pessoas no mundo que celebram ambos, mas a vida é estranha e aleatória e liga estes dois pontos com uma linha que me atravessa.
A escrita sempre foi uma parte importante da minha vida, mas começou a pesar na balança por volta do meu primeiro diagnóstico de cancro da mama. Durante muitos anos, trabalhei com políticas ambientais, o que me deu um propósito, mas quando me perguntei o que queria fazer até ao fim da minha vida, a resposta foi evidente e, muito lentamente, passei a dedicar-me à escrita (e à linguagem clara) a tempo inteiro. Escrever (e reescrever, e editar) é o meu lugar feliz.
Escrever é também o meu lugar de pensar e sentir. Por isso, quando no início deste ano me foi diagnosticado um cancro da mama metastático (MBC, na sigla em inglês), comecei a escrever para mim própria, à procura de respostas e das perguntas certas, pondo em palavras as minhas preocupações, para as compreender melhor. Com o passar dos meses, preenchi muitas páginas com a terapia da escrita. Algumas palavras eram esperançosas, outras eram esmagadoras, outras eram surpreendentes. Estava a falar com a página vazia e tudo fluía para esse espaço.
Não estou sozinha: tenho a sorte de ter pessoas com quem falar. Tenho pessoas que amo e que abraço, com quem choro, fico calada e parto em aventuras; pessoas que estão lá para mim se eu tiver uma emergência às 4 da manhã - e estou muito, muito grata por isso (mesmo que tenha dificuldade em pedir ajuda - isso é assunto para outra sessão).
Mas... É difícil falar sobre alguns temas quando nos preocupamos com a reação da outra pessoa e com a sua sensibilidade em relação ao assunto. O que para nós é o novo normal, para as outras pessoas pode ser uma grande questão, especialmente se viveram o cancro de perto.
Não estou sozinha, mas há um tipo particular de solidão nestas circunstâncias.
Foi então que, durante uma insónia, encontrei um subreddit para pessoas que vivem com MBC. Nessa noite, li as mensagens de pessoas que estão a passar pelo mesmo que eu. Encontrei pessoas que estão a tomar a mesma medicação, a falar sobre os efeitos secundários e os resultados. Li sobre uma mulher que não tinha indícios de doença e outra cujas metástases ósseas pioraram, apesar do ribociclib. Encontrei pessoas que estavam a viver isto há dez anos.
Há histórias de sofrimento e de coragem, sessões de desabafo, scanxiety e uma dose de bom humor para acompanhar. É um sítio onde as pessoas entendem os altos e baixos desta montanha-russa.
Foi esta comunidade que me inspirou para publicar as minhas histórias e partilhar as minhas «sessões de terapia» de uma forma que pudesse ser útil para alguém que estivesse à procura dos mesmos temas.
Mas... Apesar de escrever desde que me lembro, apesar de ter enchido inúmeros cadernos e ficheiros, apesar de ter tido milhares de palavras publicadas como ghostwriter, nunca tive a coragem de colocar as minhas próprias palavras à vista do mundo.
As razões deste bloqueio interno são aborrecidas: síndrome do impostor, medo de falhar, medo de não ser suficiente, medo da rejeição, medo da exposição. Em 2023, essas razões tornaram-se cada vez menos importantes.
E depois conheci um anjo, numa festa, que me disse «escreve sobre o que estás a passar - vais inspirar outros». E depois outros anjos ouviram alguns dos meus textos e disseram-me «tens de os publicar». E fi-lo.
Este ano, e mais uma vez, o peso na balança foi deslocado, e seguiu-se um novo equilíbrio.
Desde o dia 13 de outubro de 2023, publico, todas as sextas-feiras, uma história ou um ensaio no substack ou uma reflexão no instagram. Faço-o para a mulher que procura respostas e as perguntas certas. Faço-o para a mulher que acabou de ser diagnosticada e está tão perdida como eu estava. Publico as minhas dúvidas para que essa mulher não se sinta tão sozinha nas suas (e começo a perceber que também publico para que eu não me sinta tão sozinha nas minhas).
Obrigada por lerem. Obrigada por estarem aqui para mim, espero poder estar aqui para vocês também.
Feliz ano novo!